Foi por medo de avião
Já é sabido que eu odeio avião. Eu sei que ele é o segundo meio de transporte mais seguro do mundo, mas quem se importa? Se cair eu vou morrer, então voar é o tipo de tortura psicológica que eu não consigo me acostumar. Por isso, criei teorias que funcionam (ou não) na minha cabeça. Se tiver criança no voo, nada de ruim pode acontecer. Se tiver excursão pra Disney então, tô salva. Não há o que justifique nenhuma maldade com pessoas vestindo moletons brancos e orelhas de ratos falantes. Se tiver casal apaixonado não cai, porque Deus não faria isso com uma galera que virou Domingos no Tinder até, enfim, conhecer a alma gêmea. Em contrapartida, se tiver velhinho, fodeu. Se tiver pouca gente no voo, acho que é Deus economizando pra matar um grupinho seleto de uma vez só. Se tiver padre eu já simulo um desmaio pra não entrar. Grupos de jogadores gringos, pra caracterizar MESMO que é uma tragédia. Além de morrer, ninguém vai lembrar de mim porque só vão falar do Soarez que batia um bolão. Que Deus o tenha. Hoje fiz uma viagem curta, de 1:15h só. Pensei “Não há de ser tão ruim, mal vou subir e já vai estar pousando”. Esperei no portão de embarque 8, e vi a fila se formando com os que seriam meus companheiros de voo pela próxima 1 hora de mantras entoados entre um “Oooouuunnn” e um “Putaqueopariupiloto, tem carga viva aqui!”; e fiz o que sempre faço, analiso os perfis pra determinar se chegou minha hora ou não. Até que vejo indo em direção à fila uma vovozinha segurando um bebê fofo, pensei: “Deus, o que você tá querendo me dizer? Assim tu me confunde!” Minutos depois se aproxima do portão de embarque o que seria um time… de futebol…Paraliso. Não me pareciam ser gringos, mas me garanti ouvindo atentamente conversas alheias até chegar à conclusão de que o time se chamava Avaí. Estaria a salvo? Era Avaí, sem H. Será que o estagiário no céu iria entender que não se tratava de um time com jogadores havaianos dançarinos do hula -hula? Eu esperava que sim. Entrei no avião, assento 4E. Fui olhando pra cima imaginando onde eu iria enfiar minha mala já que todos os jogadores entupiram os compartimentos com malas azuis, idênticas. Achei meu assento, empurrei algumas malas, encaixei a minha. Olhei pras poltronas; meu assento era o do meio. Janela e corredor ocupados por 2 velhinhos de 100 anos cada. Gelei. Olhei pra ela e perguntei : “- Vocês estão juntos? Eu posso sentar aqui no corredor se quiser”. Ela me diz “- Não, não! Obrigada pela intenção mas o meu par é ele aqui”, apontando pra um senhor que beirava uns 120, sentado no corredor do lado oposto. Ela diz “- Sempre sentamos no corredor, no caso de termos que levantar depressa”. O meu sorriso era de desespero. Sentei, respirei fundo e aguardei a morte chegar. No meio do voo, recebemos uns biscoitinhos salgados da companhia aérea, e eu pensei: “Minha última refeição vai ser um pacote de biscoitos integrais da Mãe Terra. Que ironia”. Olho pro lado e a senhorinha não conseguia abrir o pacote. Perguntei “Quer que eu abro pra senhora?” Ela disse “Ah, por favor eu tremo um pouco e não consigo abrir”. Pensei “Se essa merda cair, ela não vai conseguir colocar a máscara de oxigênio em mim. Por quê Deus? Por quê?!” O voo seguiu, tranquilo, como se eu estivesse no sofá da sala. O piloto anuncia pouso e eu desespero; penso que fui torturada até ali por uma hora pra morrer no fim. Olho pra senhorinha como quem pede colo, e ela me olha compadecida da minha agonia. Falo: “- Sabe o que é? Não consigo acostumar com avião” Ela diz “- Tem medo?” Eu digo “ – Tá mais pra pavor” Ela pega na minha mão: “- Não se preocupa não, antes de subir eu rezei bastante.” Eu digo “ – Que sorte a minha pegar esse voo com a senhora então”. Ela finaliza me dando uma piscadela : “- E olha que bom, aqui no voo ainda tem um time de futebol inteiro pra te ajudar a descer mala.” Eu ri. Sorri. Descemos do avião. Ela sentido a esteira de malas me desejou boa sorte na volta e eu fui embora pensando que a vida surpreende a gente o tempo todo, que o medo é paralisante, e que o monte de certezas que a gente tem, não passam de “achismos” sem sentido, que guiam a gente pra lugar nenhum. Cultivamos hábitos ruins, cristalizamos certezas absolutas, e vivemos uma vida toda como crianças girando com a testa no cabo de vassoura. Não pode parar, senão vai cair. Mudar dá um medo danado, te exige coragem de Kamikaze e vez ou outra não vai sair como planejado. E tá tudo bem. Tudo bem arriscar, tudo bem errar, tudo bem se arrepender, tudo bem voltar atrás. O que não tá tudo bem, é você viver uma vida toda calçando esses sapatos 2 números menores do que o seu, porque não aprendeu a falhar. Não sofra pelo que não pode controlar. Solte as amarras imaginárias que você mesmo criou. Acredite, é libertador.
Cardápio do Amor
Arrisco-me a dizer que a palavra Amor tem sido proferida ultimamente com significativa frequência e que curiosamente no mesmo passo temos vivido tempos de intolerância, polarizações simplistas, ódio e extremismo apaixonados. O que me leva a perguntar por que todo mundo tem a palavra amor girando no céu da boca, pronta pra enriquecer qualquer discurso e embasar todas as teorias e não conseguimos pôr em prática nem mesmo em nossos pensamentos e sentimentos, diga-se nos nossos atos e passos??? Mal praticamos gestos de carinho e ternura com nossos parceiros, familiares e amigos, diga-se com o nosso entorno um pouco mais distante. Uma conclusão extraída de minhas reflexões foi que a abrangência e a subjetividade da palavra Amor, com sua tamanha profundidade e tanta magia que carrega, acaba por teorizar tudo com fala macia, mas converge pra um vazio, com reações e práticas automaticamente impessoais, comumente individualistas e às vezes até agressivas; como se de tão vastos e fortes fossem os braços, não se fizesse possível fechá-los; de tão longa e ampla a nossa régua, não somos capazes de medir os nossos pequenos e corriqueiros gestos… Na maioria das vezes amamos inconscientemente, de forma orgânica e automática, quando temos similitudes ou qualquer carinho especial envolvido, que transborda em fraternidade, carregada de um teor pessoal por nossos pares. Mas outras vezes, amar (no sentido prático da palavra, como sendo o gesto de dar e receber amor) é uma construção mais trabalhosa, que requer empenho, reflexão e um bocado de humildade e consciência. Com um pouco mais de humanismo e um cadinho de empatia talvez viéssemos a concluir que, se formos submetidos à mesma realidade e nas mesmas circunstâncias, talvez agíssemos igual ou pior a tudo aquilo que estamos prontamente condenando. E talvez essa nossa incapacidade de nos colocarmos no lugar do outro, de respeitarmos opiniões e crenças diferentes das nossas e aceitarmos com todo o nosso coração que as pessoas sejam o que elas quiserem ser, é o que nos impede de desarmar essa bomba social que temos construído ultimamente. Na dúvida por qual posicionamento adotar, pra saber se tem amor envolvido no rolê, eu proponho uma simples troca de lugar com o outro, e um breve questionamento se o que estamos entregando, é o que de fato gostaríamos de receber?!? Por isso arrisco dizer que o Amor como uma prática consciente, torna-se uma postura, um estado de espírito, uma via de mão dupla pra conduzir a maneira de ler a vida e se relacionar com o tudo à nossa volta. Se tentarmos enxergar as causas, talvez entendamos as consequências. Nossas e dos outros… sigamos!!! “Amor não se tem… Amor vai e vem…” …e quanto mais damos… mais recebemos!!!
Raquel Parrilla: CHECKLIST
Se eu pudesse te dar conselhos, diria pra beber mais água, com menos calmantes. Que no frio, você use meias felpudas e coloridas ou listradas de dedinhos. Que não há rostinho bonito que sustente uma máscara mal ajambrada por muito tempo. Que tudo na vida é temporário. Siga o fluxo. Que se a sua felicidade é pautada na infelicidade de outra pessoa, existe uma grande chance de isso dar errado. Que é preciso entender que todo diferente é também igual de alguma forma, e se colocar no lugar do outro custa nada além do teu tempo. Que pode doer, ou não. Tudo vai depender do ângulo que você decidir enxergar. Que roupas de cama limpas, fazem um milagre pra qualidade do sono. Que você nunca perde nada. Ou você ganha, ou aprende. Que qualquer coisa que custe a sua paz, é muito cara. Que existe uma linha, não tão tênue, entre imaturidade e mau caratismo; e é importante saber diferenciar qual deles o tempo resolve, e qual ele reforça. Que o Peter Pan tinha lá suas razões pra não querer crescer. Que você conhecer muito bem alguém, não te garante conhecer muito bem ninguém. Que na vida de alguém, ou você entra ou sai de vez. O que não vale é ficar no corredor atrapalhando a passagem. Que você reclame menos, porque a palavra tem força e habilidade de bumerangue. Que tomar algumas rasteiras, dessas que pegam a gente desprevenido e de quem menos se espera, faz parte do jogo. É preciso levantar e aprender que a pele de cordeiro, se prestar bem atenção, não cobre o focinho do lobo. Que é importante identificar a diferença entre perda e livramento. Que se deve prestar atenção nos sinais. Eles piscam em neon, mas preferimos enxergar apenas um letreiro bonito. Que você pode até cair, mas o importante é que caia atirando. Que a sua beleza sempre vai depender da iluminação. A que vem de dentro devocê. Que viajar é um Rivotril que não precisa de receita. Que se afastar de quem te faz mal, faz com que você se aproxime de si mesmo. Que é possível ser feliz sozinho, desde que você não confunda solitude com solidão. Que gostoso mesmo é quem faz Primavera na tempestade da gente. Ao som de JackJohnson. Vem! A vida é mais bonita vista daqui de cima!
Rô Figueiredo: O peso do “enter”
Ao passo que dentro de qualquer aplicativo de texto o “Enter” serve somente para trocar de linha e pode ser revertido com um simples “Backspace”, no universo online na maioria das vezes pode significar um caminho sem volta, pro sucesso ou pro fracasso da operação, mediante o nível de atenção empenhado na ação. Desde uma transação de banco à um comentário infeliz numa mídia qualquer, passando por sites de compra e afins, uma confirmação virtual normalmente é mais espontânea e impulsiva do que um gesto na vida real, e em função talvez de todo o dinamismo envolto no conceito de navegação o usuário acaba sendo menos cauteloso no mundo digital do que fora dele. Mesmo que não seja do conhecimento geral, a internet é um universo bastante vigiado e super hiper mega controlado. E esse controle aliás, está cada dia mais fácil em função de um sistema mais inteligente na manipulação de dados e mais vigiado porque o nosso comportamento interessa por todos os pontos de vista. Do consumo à influência que exercemos dentro dos interesses (do consumo…. hahaha)… Comprovações práticas dessa vigília (robótica e humana), que vão desde o pipocar de banners, adds e promoções de algo que você só ameaçou querer saber quanto poderia custar até a fiscalização “nível hard” nas redes que algumas vezes resulta em completos massacres dos perfis, servem para advertir desenhando em giz de cera o seguinte: A Internet não é terra de ninguém!!! Já ouvi algumas vezes um chororô alegando que esse mundo tá ficando chato, não se pode falar mais nada, que não se fazem mais piadas como antigamente e que tudo vira motivo pra mimimi. Me conforto pensando baixinho a tamanha desesperança que reinaria se as coisas nunca mudassem e me animo acreditando que uma sociedade que se “autofiscaliza” se autoajuda a evoluir constantemente. É verdade que por vezes algumas vozes virtuais se excedem e borram o tom do questionamento e da fiscalização na busca pelo progressismo. O que é compreensível em função da novidade de tudo isso, desde a possibilidade de expormos a nossa opinião e ela ser ouvida, até o fato de termos uma (quase sempre tão radical). Mas penso que o conjunto dessa obra acaba por ter um saldo positivo. Se o navegante (ou viajante) não optar por uma relação digital (e obvio, também real) mais humana, fraterna e colaborativa, através dos caminhos da própria consciência, visando uma sociedade mais saudável, ao menos que o faça então pelo medo de ser enxovalhado no mundinho virtual!!!